domingo, 2 de janeiro de 2011

O Livro e a Vida


Nas páginas de pergaminho doirado
do livro na minha memória guardado
procuro com afã e muito cuidado
o "flash" primeiro que lá ficou gravado.
e, por cenário bucólico rodeado...

Juntinho ao valado ou à caniçada
com passadas largas que marcam o chão
camisa clara de manga arregaçada
caminha seguro de enxada na mão.

E ao virar a página, a mui desejada
boneca em borracha, sorrindo rosada.
E os lindos sapatos de cor encarnada
comprados com esforço no fim da jornada.

Em noite de Outono, sem chuva mas fria
esperava por mim na rua vazia.
P`ró almoço de Natal, óh que alegria!
um freguês amigo consigo trazia.

E já na "casinha" joga dominó.
Tem muitos amigos, não se sente só.
E quando o seu tempo já custa a passar
sentado à janela vamos conversar.

"A minha mãe era uma boa modista,
o meu avô trabalhava na cortiça
e o meu pai passou a vida a soldar.
Dos meus irmãos pouco tenho a recordar."

E em final de tarde, para o mar olhando
vê o pôr do sol. "Onde irá ele chegando?"
Seu olhar claro, terno e brilhante
fixa a estrada doirada e ondulante.

A noite cai, mas fica-nos a certeza
amanhã virá cheio de cor e beleza.
Nos jardins lindas flores vão abrir.
Muitas crianças para a vida irão sorrir.

E as páginas de pergaminho doirado
do livro na minha memória guardado
fecham-se com suavidade e muito cuidado
preservando o tesouro que ali está gravado.

A meu pai,
no centenário do seu nascimento.